Veredas do Capitão Rosa
Carlos Alberto Carvalhaes – Cel. PM
Cadeira Nº67
Patrono: Padre Belchior Pinheiro de Oliveira
Antonio Fernando de Alcântara – Cel. PM
Academia de Letras “João Guimarães Rosa”, da PMMG.
Em 19 de novembro de 2006 comemorou-se o trigésimo nono
aniversario do “encantamento” do mago da Literatura Luso – Brasileira
– João Guimarães Rosa – aquele que revolucionou pelo fascínio de
seu curial escrever, proporcionando uma nova evolução ao vernáculo,
devido à sua vocação e sensibilidade literárias, assaz reacionárias.
A emoção da posse do romancista após sua última oração,
preferida na Academia Brasileira de Letras, em 16 de novembro de
1967, fez com que três dias após a rosa murchasse e tornasse um
marco de luz cultural, incorporando-se aos espíritos dos grandes e
imortais escritores da humanidade. “Recentemente, em eleições
pratica mentes simultâneas, os jornais britânicos “The Guardian” e o
Norwegian Book Clubs”, ambos divulgados pelo Instituto Nobel
Norueguês, em Oslo, a obra “Grande Sertão: Veredas” foi incluída
entre os cem principais escritores de todos os tempos, com a mesma
obra sendo colocada ao lado de Dante, Dostoievski, Proust e James
Joyce. Pena que Harold Bloom, talvez o maior crítico literário da
atualidade, não tenha incluído Rosa entre os seus escritores
preferidos, mesmo sendo estimulado, em correspondência, com envio
da obra, pelo presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Minas
Gerais, doutor Marco Aurélio Baggio. Certamente, algum dia, Bloom
dará o devido valor à obra de Rosa e publicara sua competente visão
sobre nosso grande autor – Guimarães Rosa. Mas, esta é outra
história que será objeto de novas e merecidas considerações
literárias.
Em 1956, publica Corpo de Baile e o seu consagrado Grande
Sertão: Veredas, seu único romance, que consagra, definitivamente,
seu estilo. Em 2006, as duas obras completaram cinqüenta anos, com
diversas comemorações no mundo literário brasileiro e internacional.
Em nosso Estado, as homenagens de admiração ao escritor são
cada vez maiores e evidentes e de justo reconhecimento, inspirando a
criação da “Academia Cordisburguense de Letras João Guimarães
Rosa e, para orgulho da policia Militar de Minas, a criação da
Academia de Letras João Guimarães Rosa, já com doze anos
incompletos de existência e da Fundação Guimarães Rosa, com
objetivos bem definidos de apoio social à Corporação de Tiradentes”.
Mesmo parte de sua biografia recebe importante revisão, ao
destacarmos de noticiários e documentos oficiais da época, sob a sua
presença como medico voluntario, na Revolução Constitucionalista de
1932, não no mortífero “Túnel” – região de Passa – Quatro (MG),
como muito se escreveu, mas, em uma das Unidades de Patriotas –
Voluntários da Força Pública – 0 12º. BIP (Batalhão de Infantaria
Provisório), misto de soldados profissionais e civis. Tal batalhão, como
outros desse tipo, reforçou o afetivo da força estadual, sendo criado
pelo Governo do Estado de Minas, em 13 de julho de 1932, tão logo
eclodiu o chamado “Movimento de 9 de julho de 1932”, foi deslocada
depois para a Zona da Mata Mineira, sediando-se em Ponte Nova e
desdobrando-se em Viçosa e adjacências. Isto devidos “a descoberta
de planos sediciosos traçados para o dia 6 de setembro” capitaneado
pelo doutor Arthur da Silva Bernardes, ex-presidente do Estado de
Minas e da Republica que, em ação divergente, tentou levantar aquela
região, opondo-se à posição getulista. 9 de junho tomou o número
8.518 na Caixa Beneficente e na Força Pública. Por ato do Inventor do
estado, doutor Benedito Valadares, de 8 de agosto do mesmo ano, foi
exonerado, a pedido, para as sumir suas atribuições no Itamarati. (MG
de 22 de setembro de 1934).
Em pesquisa realizada no Arquivo Público Mineiro, no item
referente à “Comissão de Tomada de Contas (Revolução de 1932)”,
vemos o nome do Capitão – Médico Dr. João Guimarães Rosa na
relação dos oficiais médicos voluntários que foram contratados pelo
Serviço de Saúde da Força Pública. È, sem duvida, um dado
significativo a ser considerado no rol de toda a pesquisa.
Intrigados ficamos, quando notamos que diversas obras e
críticas literárias atribuíam a Rosa sua presença no Túnel de Passa –
Quatro, integrando o Corpo Médico da Força Pública Mineira ali
posicionada.
A principal fonte que relata, com minúcias, a atuação da Força
Pública nesse evento histórico, de autoria de Coronel Edmundo Lery
dos Santos – “O Movimento de 9 de julho de 1932” – detalhado
relatório sobre a campanha fratricida, publicado em 1933 pela
Imprensa Oficial de MG. Em nenhum momento cita a presença do
Capitão Médico João Guimarães Rosa no “front”, em Pass a Quatro
(MG).
Pesquisadas outras fontes, pois deveria ter havido engano do
autor, que, inclusive, comandou a Brigada Sul, naquela refrega,
constatamos que, realmente, nenhuma delas citava a presença de
Guimarães Rosa na região do Túnel.
Abordaremos aqui cinco obras de peso histórico e literário,
dentre as varias estudadas, que foram exaustivamente pesquisadas e,
em nenhuma delas há registro da presença de Rosa na região do
Túnel, tampouco noutros locais. Infelizmente, os próprios registros nos
arquivos da PMMG são omissos nessa questão. Registram, apenas, a
inclusão e a exoneração, a pedido, de Rosa das fileiras da
Corporação.
Além do “Movimento de 9 de julho de 1932”, acima citado, foram
estudadas e devidamente pesquisadas as seguintes obras:
“As Três Revoluções – 24/30 e 32”, de autoria do Coronel e
Historiador Paulo René de Andrade, membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), em dois volumes –
editados pela Imprensa Oficial do Estado. Não há nenhuma referência
ao assunto;
Crônicas da Policia Militar de Minas, do Tenente – Coronel
Geraldo Tito da Silveira, igualmente membro da Casa de João
Pinheiro, que também silencia a respeito;
“História do Brasil”, do historiador Pedro Calmon, membro da
Academia Brasileira de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro, em sete volumes que, no sexto, aborda a Revolução de
1932 e nada revela sobre obsc uro Guimarães Ros a. Calmon, um dos
mais ilus tres historiadores conhecidos, teve sua obra prima publicada
pela livraria José Olympio Editora, em 1959;
“Juscelino Kubitschek de Oliveira – O Médico”, de autoria do
historiador e Coronel Médico da PMMG Fernando Araujo, ex –
presidente da Academia Mineira de Medicina e membro afetivo do
IHGMG, que descreve, com propriedade, a vida e obra médica de JK,
inclusive, sua participação na Revolução de 1932, como Capitão
Médico da Força Pública. Em nenhum trecho de sua obra, cita figura
ilustre de Rosa na região do Túnel de Passa Quatro;
O próprio JK, ex – prefeito de Belo Horizonte, ex – governador
de Minas e ex – presidente da República, também Coronel Médico da
PMMG, em sua obra “Meu Caminho para Brasília”, ao citar sua afetiva
participação no movimento revolucionário de 32, omite a presença de
Rosa no quadro médico em operações, entre aqueles profissionais
que atuaram no Hospital do Sangue e no Trem – Hospital, que se
posicionou mais próximo da frente de combate.
Guimarães Rosa deixou, em seus escritos, uma nuvem de
mistério quanto ao assunto. Mencionou, apenas, na entrevista que
concedeu a Günter Lorenz, sua experiência como “soldado e rebelde”,
que conheceu o sofrimento e a angústia em situações de guerra.
As diversas opiniões de autores, nunca esclarecidas e bastantes
polêmicas, até hoje, mesmo com as provas documentais existentes e
por nós levantadas, insis tem em citar a presença de Rosa em Passa –
Quatro inclusive sua filha, a escritora Vilma Guimarães Rosa em seu
festejado livro Relembramentos – João Guimarães Rosa, Meu Pai,
publicado pela Editora Nova Fronteira, em 1983 e 1999,
respectivamente.
Da carta, publicada pelo doutor Marco Aurélio Baggio,
presidente do IHGMG em Um abreviado do Grande Sertão: Veredas,
que Guimarães Rosa dirigiu ao doutor Oswaldo Fortini, que o
substituiu como médico no 9º. BI de Barbacena, por ocasião em que
prestava concurso para o Itamarati, datada de 26 de junho de 1934:
“acabo de terminar as provas escritas: só terça – feira que vem
poderei estar ahi... Rogo-te, pois agüentar firme... estou jogando meu
destino nesta cartada... Rogo-te, além disso, explicar a situação ao
Comandante” (grifamos). Este documento é mais uma importância
referência da passagem de Guimarães Rosa por Barbacena e pelo 9º.
Batalhão.
Consideramos esgotada a pesquisa da trajetória do Capitão
Médico Dr. João Guimarães Rosa, na Revolução de 1932, no que diz
respeito ao Batalhão onde serviu e ao local de sua atuação. Os
aspectos principais desse caminho ainda estavam duvidosos para
alguns pesquisadores e es critores, mesmo diante das evidências
corroboradas em nossa publicação no Caderno “Pensar” , do Jornal
“Estado de Minas”, de 26 de novembro de 2005 e no III Seminário
Guimarães Rosa em agosto de 2004, na PUCMG, também publicado
pela Revista nº. XXXVII da Ac ademia Mineira de Letras e pela Revista
do Tribunal de Justiça Militar de MG, que deram maior amplitude e
consistência aos estudos e pesquisas sobre o tema.
Já não exis tem mais dúvidas, nem tampouco documentos outros
que possam contrariar que referido oficial médico estava incluído e
incorporado no 12º. BIP (Batalhão de Infantaria Provisório), criado,
como dissemos no dia 13 de julho de 1932, em situação de
emergência. Na época, o Governo de Minas viu-se obrigado a se
servir do voluntariado de pessoal para complementar a Força Pública
em seu desiderato de conter, não só a frente paulista no sul do
Estado, como o de sufocar o intento sedicioso de 6 de setembro
daquele ano, na Zona da Mata mineira, capitaneada pelo ex –
presidente do Estado e da República, doutor Arthur da Silva
Bernardes.
Resumindo os assuntos já publicados e para efeito de clareza,
foram transcritas duas publicações do Órgão Oficial do Estado, o
Jornal “Minas Gerais”, da Coletânea ex istente na “Hemeroteca do
Arquivo Público do Estado”, ambas oriundas da cidade de Ponte Nova
e datadas de 6 de setembro de 1932, já mencionadas.
Mesmo com todas essas evidências e discussões, alguns
autores continuaram em dúvida e insistem em apresentar a tese de
Guimarães Rosa em Pass a – Quatro.
Ao pesquisar, “in fine”, os Boletins da Força Pública de Minas
Gerais – Estado – Maior, existentes no excelente acervo do Museu da
Polícia Militar de Minas Gerais, que esta sendo reorganizada e
revitalizando pelo c omando da Corporação para ser um dos mais
expressivo de Minas – encontramos os seguintes registros que
encerram de maneira definitiv a esse assunto. Ei-los:
“Comando – Geral da Força Pública de Minas Gerais – Estados
– Maior:
11 de agosto de 1932. Boletim número 183...
Seguimentos: com destino a Ponte Nov a seguiu hoje o 12º. BIP,
com o afetivo de 15 Oficiais e 328 Praças, cuja Oficialidade é a
seguinte: Major Joaquim Augusto de Oliveira, Capitão João Afonso
Lins, segundos Tenentes concessionados Antônio Gomes (1º.)...,
assim com o senhor Capitão – Medico Doutor João Guimarães Rosa e
o enfermeiro contratado Maximino da Cruz”. Esta publicação consta
da pg.911, do boletim mencionado.
Do Boletim número 239, pg.1147, de 6 de outubro consta:
“Apresentação: Procedente de Ponte Nova, onde se achavam
em diligênc ia, apresentaram-se os seguintes oficiais do 12º. BIP:
Major Joaquim Augusto de Oliveira, Capitão João Afonso Lins... e o
Capitão – Medico João Guimarães Rosa”.
Assim, pois, fica bem caracterizado que o Capitão Médico
Doutor João Guimarães Rosa estava incorporado, durante a
Revolução de 1932, no 12º BIP, que ficou sediado, de início, na
Capital do Estado. Posteriormente, deslocou-se para Ponte Nova,
sendo que, a 6 de setembro, foi transferido provisoriamente para
Viçosa (Livro de Registro do 12º BIP – Oficiais), onde prestou
relevantes serviços, tendo sido elogiado pelo Coronel José Gabriel
Marques, Comandante da Força Pública em operações, no Boletim
número 244, de 12 de outubro de 1932.
O que deve ter levado alguns autores ao equívoco dessa
questão foi o fato de não terem documentos oficiais às mãos, como
por ser o Capitão Rosa o orador oficial da “inauguração do quadro
alegórico dos Oficiais e Praças que tombaram no campo de luta, por
ocasião da Revolução”. Tal evento ocorreu, quando da instalação do
9] Batalhão da Força Pública em Barbacena, no dia 27 de maio de
1933, tendo como Comandante o Coronel Octávio Babtista Diniz.
O Capitão Médico Doutor João Guimarães Rosa, juntamente
com o Coronel Médico Doutor Juscelino Kubitschek de Oliveira e o
Alferes Joaquim José da Silva Xavier, O Tiradentes, além de outros,
são eminentes homens da saga da Polícia Militar de Minas Gerais.
FONTES CONSULTADAS
Abril, Almanaque: “Quem é Quem na História do Brasil”, Editora Abril
Cultural Multimídia, São Paulo, 2000;
Alcântara, Antônio Fernando de, “As Veredas do Capitão Rosa”, Caderno
Pensar do Jornal “O Estado de Minas”, de 26 de novembro de 2005; pesquisa
jornalística e documental no “Minas Gerais”, Órgão Oficial do Estado – diversas
publicações – 1932, 1933 e 1934; Boletins Gerais da Força Pública – diversos –
1932,1933;
Andrade, Paulo René de: “Três Revoluções – 24, 30 e 32”, v.2, Imprensa
Oficial de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, 1978;
Araújo Fernando: “Juscelino Kubitschek, O Médico”, 2ª Edição – Editora
Lithera Maciel, 408 p., ilustrações, Belo Horizonte, MG, 2000;
Brait, Beth: “Literatura Comentada – Guimarães Rosa”, Editora Abril
Educação, São Paulo, 1982;
Calmon, Pedro: “História do Brasil”, vol. VI, Livraria José Olympio Editora,
Rio de Janeiro, 1959;
Carvalhaes, Carlos Alberto: “A Verdade sobre a participação do Capitão
Médico João Guimarães Rosa na Revolução Constitucionalista de 1932”: Terceiro
Seminário Internacional Guimarães Rosa, da Pontifícia Universidade Católica de
MG, agosto de 2004, publicada na Revista XXVI do IHGMG, Belo Horizonte, MG,
2005;
Kubitschek, Juscelino: “Meu caminho para Brasília”, Bloch Editores S.A,
Rio de Janeiro, (RJ), 1974;
Mirador, Enciclopédia Internacional: “Verbete Guimarães Rosa”, p.5605,
v.11, Encyclopaedia Britannica do Brasil, São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ),
Brasil, 1982;
Perez, Renard: “Perfil de Guimarães Rosa”, Nota Biográfica, publicada no
livro “Primeiras Histórias”, de João Guimarães Rosa, introdução de Paulo Rónai,
Livraria José Olympio Editora, Coleção Sagarana, v.90, 10ª Edição, Rio de
Janeiro (RJ), 1977;
Revista dos Governadores de MG, pg. 134, número 17, Imprensa Oficial,
Belo Horizonte (MG) , 2002;
Rosa, João Guimarães: “João Guimarães Rosa” – Ficção Completa, v. 1,
Biografia com G. Lorenz, Editora Nova Aguilar, Rio de Janeiro (RJ), 1995;
Rosa, Vilma Guimarães: “Relembramentos: João Guimarães Rosa, Meu
Pai”, 2ª Edição revista e ampliada, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro (RJ),
1999;
Silveira, Geraldo Tito: “Crônica da Polícia Militar de Minas”, 2ª Edição,
Editora Santa Edwiges Ltda, Belo Horizonte (MG), 1991;
Wirth, John D.: “O Fiel da Balança – Minas Gerais na Federação Brasileira”
– 1889 a 1937”, p. 168, Editora Paz e Terra, RJ, 1982.
sexta-feira, 20 de junho de 2008
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